Buscando informações sobre
o trabalho relevante em sala de aula de Língua Portuguesa, recebi a sugestão de leitura de um texto
acadêmico. O trabalho " A retextualização como
trabalho didático", de Rosane de Mello, apresentado no Celsul, expõe que
a reescrita textual é bastante utilizada para a aprendizagem da produção
textual. É uma prática na qual observamos aspectos relativos às mudanças de um
texto no seu interior. Vislumbra marcas sociais dos gêneros, mas fica limitada
quanto aos usos sociais.
A retextualização é
considerada como a metodologia mais adequada para a aprendizagem de gênero
textual na escola.
O gênero estudado pela
professora é a anotação, usado por alunos e professores.
Transcrição é o texto
transcodificado da produção oral original, no qual se evitam pontuação,
inserções e qualquer tipo de eliminação, traz indicações de situacionalidade e
de qualidade de produção. A retextualização é um momento posterior, baseado em
operações mais complexas, que realizam mudanças no texto-base (Marchschi,
2001).
Na anotação a compreensão
é fundamental. Ela é considerada um gênero de reformulação de uma produção oral
para outra escrita, a fim de preservar informações para uma posterior
consulta.
Ela
é uma produção para o próprio escritor e depende das interpretações que ele faz
na situação de sócio-comunicação em que se encontra. Algumas vezes essa anotação
poderá ser retextualizada, tornar-se um relatório, uma resenha, uma memória,
etc, mas também pode ser um texto final, com o simples objetivo de tomar notas.
São
9 as operações que acontecem na anotação:
- Estratégia de eliminação – baseada na idealização lingüística, elimina marcas interacionais, hesitações da fala.
- Pontuação – simula a entonação da fala.
- Estratégia de eliminação com retirada de repetições, paráfrases, pronomes egóticos, reduplicações.
- Produção de um resumo, simultânea a segunda operação, decisão de agrupamento do conteúdo, disposição do texto em blocos, marcação do início desses tópicos. – depende da consciência do aluno em disciplinar o texto.
- Substituição e reorganização de natureza pragmática, substituindo palavras pelos nomes específicos (alguém, um lugar...).
- Reconstrução de estruturas truncadas, concordâncias, reordenação sintática e encadeamentos.
- Estratégia de substituição com vistas à uma maior formalidade.
- Reordenação tópica do texto e da sequência argumentativa.
- Estratégia de condensação de argumentos, transformando e não eliminando informações.
Segundo
a autora, em um dos estudos realizados, durante uma palestra os alunos tomavam
notas corridas, com frases coesas e coerentes, mas esparsas e raramente
apresentavam marcas de oralidade. Já os presentes que não eram alunos, faziam
esquemas e registravam palavras-chave, raramente apresentando frases, o que
leva a crer que a retextualização depende dos objetivos do autor.
A
professora observou também que ao retextualizar a palestra os autores retiravam
informações que não consideravam relevantes, como a autoria da citação e a
opinião do palestrante, o que pode vir a explicar uma reclamação constante dos
professores de que os alunos não registram corretamente os comentários que eles
fazem em sala de aula.
Em
um curso que fiz, um professor constantemente avisava o que era para ser
anotado e pedia que registrássemos com atenção o que ele dizia, uma outra
professora solicitava que marcássemos palavras-chave na legislação brasileira
referente ao ensino no Brasil. Penso se faria mesmo diferença em nossas aulas avisar
aos alunos, que não são acostumados com essas anotações, haja vista a pergunta
constante: “É para copiar?”. E isso eles perguntam não do que o professor diz e
sim sobre as anotações que o mesmo fez no quadro. Segundo a autora, quando o
aluno faz uma cópia, acreditando ser uma anotação ele comete um erro, age
passivamente sobre o texto, ao invés de retextualizar, que implica uma ativa interação,
transformando um texto oral em escrito, compreendendo-o, apropriando-se do seu
conteúdo e de seu sentido, interferindo sobre o que aprendeu, uma “tradução
endolígue” (Marcushci, 2001).
De
acordo com Roseane o anotador deve saber escolher o que anotar, pois os
sentidos são produzidos na relação do sujeito com a língua e pelos seus
conhecimentos prévios.
Penso
então que é importante os alunos conhecerem o currículo, saberem o que vão
estudar e o que se espera que eles aprendam, auxiliando assim quais são as
anotações relevantes e evitando que se ocorra o erro de anotações mal
interpretadas. É interessante que se revise as anotações com os alunos. O
professor pode questionar se o que foi anotado foi realmente o que ele quis
dizer, ou mesmo, ter o cuidado de, se fizer um trocadilho, verificar se o aluno
entendeu o que era para ser anotado e não tomar o trocadilho como verdade.
Parece estranho, mas é comum quando não se tem domínio do que é exposto que se
façam interpretações errôneas e que se escreva exatamente o contrário do que se
quer dizer. Como a anotação é um texto para ser lido posteriormente, é
necessário que os registros sejam claros e confiáveis.
É
interessante o aluno compreender que para garantir o seu aprendizado no seu
estudo futuro das anotações ele não precisa registrar exatamente tudo o que o
professor fala, o que seria uma transcrição e não uma retextualização.
Há
ainda pela análise da autora a presença de pronomes egóticos (eu, nós), nas
anotações, que podem e, na minha opinião, devem ser suprimidos, como um
exercício para a construção de uma argumentação. Isso pode demandar um tempo,
já que é um aprendizado, mas é bastante válido, visto que comumente acabamos
por criar hábitos de escrita.
Se
eles registrarem, por exemplo, frases distantes, como tópicos apenas, segundo a
autora, fica impossível estabelecer uma relação coesiva entre elas. A interveção
do professor ao meu ver é essencial para que todos esses aspectos sejam
trabalhados com os alunos.
Penso
ser interessante o trabalho com memórias, textos feitos pelos alunos com vistas
a expor os conhecimentos adquiridos nas aulas, fazer questionamentos e propor
investigações. Os textos podem começar simples, com anotações primárias e se
regulamentando aos poucos, atendendo as novas propostas, que precisam ser
gradativas para não desanimar os autores.
Além
de ser um aprendizado do gênero, facilita toda uma exposição de argumentos para
a reconstrução de sentido dos textos, já que apresenta na prática muito o que
se faz necessário em textos mais elaborados, como a dissertação argumentativa.
Estratégias
de correção podem ser criadas em conjunto com os alunos, facilitando o trabalho
do professor e possibilitando uma maior autonomia na reescrita e
retextualização. Com o passar do tempo, os textos podem passar a investigativos
e com uma criticidade aguçada. Tudo depende de como será conduzido o processo
mediante as dificuldades apresentadas pelos alunos. Nesse ponto a postura do
professor como mediador é fundamental. Construir junto é muito mais do que uma
mera correção.
Referência: SANTO NICOLA, Rosane de Mello. A retextualização como trabalho didático. Celsul.
Disponível em:
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